sábado, 24 de janeiro de 2009

Fã do Rui

Uma das frases mais conhecidas de José Cid (para além de “Faz-me favas com chouriço”) é, seguramente, aquela que os estudantes do Porto tiveram ocasião de ouvir em 2004 aquando do concerto de José Cid na Queima das Fitas dessa cidade: “ Se o Rui Veloso é o pai do rock português, então nesse caso eu sou a mãe!
Quem ler esta frase, sem conhecer os artistas em questão e sem qualquer outro contexto que não o de festa estudantil, ficará imediatamente com a ideia que José Cid queria atacar o artista Rui Veloso e que a relação entre os dois é de extrema conflituosidade, como se lutassem os dois pelo ceptro de Pai do Rock Português. Não vamos entrar pela questão do pai do rock português, pois não é isso que mais nos interessa; o que pretendemos com a mensagem de hoje é partilhar convosco a homenagem que o próprio José Cid fez ao artista Rui Veloso em 1991 no seu disco duplo “ De par em par” (LP 848974-1 Casablanca/ CD LP 848974-1 Casablanca), através do tema “ Fã do Rui”. Um tema muito simples, de dois minutos, escrito numa época em que Rui Veloso conquistou o mercado discográfico com o duplo álbum “ Mingos e Samurais”, popularizado por temas como “ Baile da Paróquia” e “Não há estrelas no céu”, entre outros. Em sentido inverso, José Cid começava, nessa altura, a sua trajectória descendente em termos de sucesso discográfico, como o próprio ironiza na canção que hoje partilhamos com os leitores.
Temos, assim, a ironia como nota dominante nesta canção, não estivesse José Cid a contar-nos uma história muito simples de um homem, que num café de Cedofeita, se enamora por Lola, uma bela mulher que, no fim de contas, era um travesti!!! (Felizmente, o recepcionista da pensão onde Lola vivia alertou o desconhecido protagonista da história para esse facto, evitando surpresas e incómodos maiores...) Desesperado, o protagonista fugiu, tendo decidido tomar mais um copo, mas desta vez numa tasca da Ribeira, onde se deparou, segundos depois, a ver um programa na televisão, no qual um moço lá do Porto tocava ao piano o tema “ A Paixão” do Rivoli. Ora, esse moço de imediato lhe “ fez lembrar outro artista, outrora tão bem famoso, que também canta ao piano e que é fã do Rui Veloso”. Para bom entendedor meia palavra basta: José Cid ironiza sobre si próprio, sobre o sucesso que outrora teve, ao mesmo tempo que homenageia o artista mais famoso da altura, declarando-se seu fã. Um ouvinte mais atento e mais conhecedor da obra de Rui Veloso, encontra facilmente neste tema de José Cid reminiscências da sonoridade de “Mingos e samurais” e, claro, do tema Chico Fininho, do disco “Ar de Rock”.
“De par em Par” ( ou Jeans), pode não ter sido o disco mais conseguido de José Cid, não tendo dele sequer resultado grande sucesso ou single digno de registo. Mesmo assim pretendemos nesta pequena mensagem, por um lado, evitar o seu esquecimento e por outro lado, relembrar ao leitor que dos trinta e tal discos de José Cid lançados para o mercado desde que José Cid começou a cantar, o pior registo que alcançou foi a prata. Tudo o resto foi ouro, platina e duplas platinas. Logo...este disco só pode estar entre uma dessas categorias atrás enunciadas. Voltaremos brevemente.

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domingo, 18 de janeiro de 2009

O Gaiteiro - Agora em galego

Os mais atentos à discografia de José Cid terão certamente a noção de que os anos 90 significaram para o Artista verdadeiros anos de ausência das luzes da ribalta. No entanto, esta afirmação não significa necessariamente que José Cid durante esses anos se tenha retirado por completo das lides musicais, bem pelo contrário: José Cid nasceu para a música, e por essa razão não parou de gravar durante os anos noventa; desde o duplo albúm “De Par em Par” ( também conhecido por “Jeans”) e de “ Camões, as Descobertas e Nós” e “ Cais do Sodré”, passando ainda pelos discos “Vendedor de Sonhos”, Nunca mais é sexta-feira” , “Pelos Direitos do Homem” e “Entre Margens”, José Cid assinou nesses anos alguns dos seus melhores trabalhos discográficos, muitos deles desconhecidos pelo público em geral, devido à estranha dificuldade em os encontrar disponíveis nas editoras para comercialização.
Há, contudo, um outro disco de José Cid, da década de noventa, que nos merece especial atenção e que é objecto de análise na mensagem de hoje. Trata-se do surpreendente “Oda a Federico García Lorca” (EPF -004 CD), gravado em 1998, por ocasião do centenário do nascimento do poeta espanhol Garcia Lorca. Neste registo sonoro, José Cid presta homenagem, não só a Lorca, mas também a Armando Martinez e à poetisa Rosália de Castro, musicando dez poemas de forma magistral, cantando não em português, mas sim em galego.
A ligação de José Cid a Espanha é inultrapassável, não fosse ele de ascendência espanhola e em particular de Ciudad Rodrigo, de onde o seu bisavô emigrou para Portugal nos finais do século XIX. No entanto, há ainda a registar neste disco um outro aspecto que, à primeira vista, poderá chocar o pensamento dos mais puristas: o som dos instrumentos étnicos ibéricos e o seu cruzamento com as guitarras de Coimbra, às quais José Cid presta também homenagem.
À semelhança do disco “Cais do Sodré”, neste trabalho musical José Cid, oferece-nos mais uma vez, um dos seus melhores registos vocais, com interpretações consistentes que dão a este disco una sonoridade muito especial. Em relação, ao tema que seleccionamos para hoje, depois de alguma hesitação, decidimos partilhar com os leitores a canção “Gaiteiro”, com letra de Rosália Castro e música de José Cid,um tema que, curiosamente, é uma versão de “Soldados Desconhecidos” de 1994, do álbum Vendedor de Sonhos. No entanto, neste registo, a temática da canção é totalmente diferente da canção de 1994, desde logo, por ser um tema em que o Artista homenageia os músicos gaiteiros, personagens comuns do universo ibérico e principalmente do universo português e galego. A identidade entre a Galiza e Portugal está aqui bem presente no tema Gaiteiro.Temos que destacar, pois é importante dizê-lo, o facto de José Cid cantar em galego, num interessante sussurro, num registo muito intimista, como se nos tivesse a contar uma história ao ouvido numa qualquer aldeia em Trás-os-Montes perdida no meio das pedras.
Para terminar, aproveitamos para expressar o nosso desejo de ver este disco à venda nas lojas de discos pois trata-se já de uma raridade, sem distribuição em Portugal, por ter sido distribuído e editado em Espanha por uma editora espanhola. Mesmo assim, não podemos deixar de agradecer aos nossos vizinhos, por se terem lembrado do nosso amigo Zé e nos terem oferecido a possibilidade de ouvir esta obra prima do Cid.
Voltaremos a este disco numa próxima oportunidade.



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sábado, 10 de janeiro de 2009

José Cid, Camões, as Descobertas e Nós...

Regressamos hoje com uma “Profecia” enunciada há mais de 500 anos : “ Na memória do nosso povo fica a Ilha dos amantes”. Façamos primeiro uma viagem por esses mares nunca dantes navegados e embarquemos nas naus de Dinis Dias, Diogo Cão, Pêro da Covilhã, João de Santarém e Pedro Escobar e redescubramos essas terras de África outrora virgens...
Viajemos também na companhia de José Cid & Amigos para além do Cabo das Tormentas e, através deles, descubramos de novo que existem outros povos, outras raças e outros usos, neste mundo imenso, tão vasto, onde a força de uns se confunde tantas vezes com a opressão de outros tantos. Por isso, invoquemos o nosso passado antes de escutarmos este tema que hoje partilhamos consigo... Lembremo-nos ainda dos sonhos do nosso Infante, e da orgulhosa história da nossa expansão. Lembremo-nos de tudo isso mas sem esquecer os gentios povos de Cabo Verde e Guiné, de Malaca, Timor, Goa, Damão, Angola, Moçambique e outros tantos, onde os nossos valentes marinheiros, exaustos, chegavam para colocarem os seus padrões. Não esqueçamos também que tão negra era a pele desses povos e que tão lindo era o seu cantar antes de lhes impormos a nossa lei e de lhes ditarmos a nossa fé durante mais de quinhentos anos.
Não esqueçamos também Luís de Camões e os Lusíadas, obra magistral da literatura mundial, da qual José Cid se socorre para ilustrar as imagens sonoras do seu disco de 1992 “ Camões, as Descobertas e Nós” ( LP - Polygram 512 638 ), a nosso ver um dos melhores discos de sempre de José Cid, infelizmente e incompreensivelmente tão pouco divulgado.
Caro leitor, não pense que estamos a exagerar... Por um lado, no nosso panorama musical são ainda poucas as obras de referência dedicadas às epopeias dos portugueses e, em particular, aos Descobrimentos. Se retirarmos da nossa memória discos incontornáveis como “Por este rio acima” e “ Crónicas da terra ardente”, ambos de Fausto Bordalo Dias, ou ainda o “Auto da Pimenta” de Rui Veloso, resta-nos escassos registos sonoros alusivos aos nossos Descobrimentos. Se pensarmos que não existe ainda em Portugal uma sinfonia ou um disco integralmente dedicado aos Lusíadas de Luís de Camões, a situação atinge contornos mais graves.
Pois bem, o disco que hoje apresentamos aos nossos leitores deveria ser um disco de referência das nossas discotecas. Primeiro, porque José Cid, reúne (em sua casa!) num mesmo trabalho vozes como as de Carlos do Carmo, Paulo Bragança, Jorge Palma, António Pinto Basto, Rita Guerra, João Paulo e A Praia Lusitana. Como se não bastasse, no mesmo disco encontramos músicos instrumentistas como Pedro Caldeira Cabral, José Luís Nobre Costa, Tó da Braguesa e o próprio José Cid nos coros, cítara indiana (!) e, claro, sintetizadores. Em segundo lugar, porque qualquer fã incondicional de Jorge Palma gostaria de ouvi-lo a cantar Luís de Camões e o mesmo podemos dizer dos seguidores de Carlos do Carmo, António Pinto Basto, Paulo Bragança ou Rita Guerra. Sem dúvida, grandes amigos que José Cid tem! A terceira (e principal razão) que nos leva a propor imediatamente publicidade editorial a este disco é a sua indiscutível qualidade. Acredite, leitor, que quem ouve este disco viaja sem dúvida no tempo, numa mistura instrumental sublime, onde as guitarras portuguesas e os sons produzidos por José Cid se cruzam criando um verdadeiro ambiente de passeio marítimo sem sequer sair no sofá.
Confessamos que foi muito difícil escolher o tema deste disco que melhor o ilustrasse. Podíamos ter optado pelo Prólogo, no qual José Cid, presta homenagem ao Infante D. Henrique, ou pelo tão conseguido “Armas e barões assinalados”, cantado por António Pinto Basto.Como já se fazia noite, optamos, por fim, por seleccionar o tema “Profecia”, com letra e música de José Cid. Para além de ser um tema muito original, mais original ainda é, sem dúvida, a pessoa que José Cid escolheu para interpretar essa canção: Nada mais do que Carlos do Carmo, a Voz do Fado, num registo vocal surpreendente, onde as sonoridades africanas predominam, não fosse a letra da música toda ela dedicada a África.
Somos sinceros, podíamos bem ter optado por um tema de José Cid a cantar, pois neste disco José Cid deixa a seu cargo duas canções. No entanto, sejamos realistas: Que melhor voz encontraríamos no panorama musical português para nos declamar esta letra de José Cid ? Acreditamos que nenhuma outra :Carlos do Carmo, é Carlos do Carmo. Ponto Final.
Não podemos deixar de transcrever a letra desta profecia que por si só já nos deixa muito que pensar:
Estes povos são gentios/ de Cabo Verde e Guiné/ é tão lindo o seu cantar/ é tão negra a sua pele/ Vou impor-lhes minha lei e ditar-lhes a minha fé/ Daqui por quinhentos anos vamos lá ver como é/ Estas praias onde chego/ são de Angola e Moçambique/ não sei se as abandono ou não sei se por cá me fique/ Daqui por quinhentos anos nada será como dantes/ na memoria do meu povo fica a ilha dos Amantes. Na memória do meu povo fica a ilha dos Amores/ daqui por quinhentos anos já não há Adamastor/ De Malaca até Timor/ e de Goa até Damão/ só a terra me dá vida/ esta nau é um caixão.
É evidente que a letra da canção fala por si e que já nos faz pensar em muita coisa. Não temos dúvidas que a profecia se cumpriu, pois do “vasto império” só nos resta mesmo a Ilha dos Amores. Mas não podemos deixar de nos despedirmos sem uma última reflexão: um português fadista a cantar música africana não será também o culminar de uma profecia?

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quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Nihelile ( Agora em crioulo!)

Ano novo, nova mensagem para os nossos leitores. O que nos reservará José Cid para 2009? Nunca saberemos… Para já, somos nós que vos iremos surpreender. Temos a consciência absoluta de que a primeira mensagem de 2009 será a mais original de sempre, não fosse ela sobre uma canção que nos deixou completamente estupefactos logo à primeira audição.
Caros leitores, vamos ser muito frontais desta vez, sem grandes textos e perfumes no ar: Preparem-se para ouvir o inimaginável. Respirem bem fundo e preparem-se para ouvir José Cid a cantar em crioulo. Sim, crioulo! De Moçambique, para sermos mais exactos.
Vamos recuar então novamente a 1971, ao mítico (e quase desaparecido) álbum “ Palha” ( COLUMBIA 8E 062-40.118 – 1971 ) já por nós comentado neste blogue- Mais uma vez perguntamos, para quando a edição em CD ?)
Infelizmente, ainda não conseguimos chegar à fala com o Artista, para que o próprio nos explique um pouco sobre a razão de ser desta canção e quais os motivos que o levaram a fazer uma versão do tema "Nihelile", do moçambicano Fany Pfumo. Por essa razão, quase que nos limitamos a colocar à disposição do leitor/ouvinte este tema sem grandes considerações laterais sobre o mesmo.
O mesmo diremos relativamente ao já falecido Fany Pfumo, do qual não existe muita informação. No entanto, podemos adiantar ao leitor que Fany Pfumo é considerado por muitos o verdadeiro rei da marrabeta (música urbana de Moçambique de estilo popular), tendo feito sucesso, após a independência de Moçambique, em terras da Africa do Sul.
Sinceramente, não fazemos a mínima ideia sobre o que José Cid canta neste tema, nem o significado das palavras que canta (repita-se, mais um vez, em crioulo). A única coisa que sabemos é que o Artista, está bem disposto, e quase de certeza( apostamos desde já consigo) que está a falar de uma mulher…
Só mais uma coisa, caro leitor: O dia das mentiras é daqui a quatro meses, por isso, caso pense que a mensagem deste dia é brincadeira, informamos desde já que está enganado: É mesmo José Cid que está a cantar!

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